Adornos para noites de chuva
E a gente fica assim, no meio de recortes de papel, cola e tesoura.
Rediagramando o que já faz e fez sentido.
Porque a minha caligrafia de menino canhoto não condiz com a beleza que nem todos vêem.
Mais fácil é julgar vulgar.
É dizer impuro.
É fechar os olhos.
Mas ainda ontem li que com os olhos fechados é que se tem mais liberdade. E, ainda com os olhos abertos, ficam assim presos na parede os versos dela. Estão presos e livres.
Dela que tem tanto de mim.
E teria ainda mais se já não fosse morta. Assim:
"E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo, prazer, lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro.
E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me".
(Hilda Hilst)
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