sábado, 22 de setembro de 2007

amor líquido

Celine,

Estamos vivendo os momentos áureos da edição videoclipe nas relações, para variar a metáfora. As seqüências em slow motion figuram cada vez mais como lembranças de filmes antigos. O problema é que guardamos esses filmes com carinho em nossa videoteca afetiva. E, para os fãs de curtas temporadas, eles são apenas os clássicos: distantes, herméticos e inatingíveis. Enfadonhos.

Não tenho nada contra os especiais de fim de ano. Pelo contrário, já me diverti bastante com eles. Mas os formatos andam se repetindo muito, por trás de uma pseudo-invenção ágil. Não nos interessa uma edição ágil. Interessa o chantilly no cappuccino quente e tudo o que deixa impressões um pouco mais permanentes do que alguns torpedos na madrugada.

Sabe o que é, dear Celine? É que os carteiros têm se mudado cada vez em maior quantidade para aquele local conhecido como canto da memória afetiva. Lá, onde guardamos as imagens que víamos dentro das bolinhas de gude; o cheiro de álbum de figurinha; a textura de manga roubada do pé; aquele envelope que chegou por engano na casa do vizinho, mas que fomos resgatar com toda a nossa devoção.

Os carteiros mudaram-se para lá. Dizem que formaram uma comunidade de uniformes amarelos, que cultua a entrega diária de cartas de amor. O serviço pesado ficou para uma nova categoria, um tanto estranha, de entregadores de mensagens via celular. Declarações de amor chegam por que mãos? Que caligrafia têm as relações que se sustentam via sms? Como saber sobre doçura e amargor sem que haja uma troca, sim, para além de respostas fofas que se perdem no tempo?

Somos capazes de mandar uma mensagem falando de futebol ou pombos entregadores de beijos. Sustentamos uma longa temporada, minha amiga, não tenha dúvidas disso. Pena é que o padrão dos relacionamentos na era da reprodutibilidade técnica imponha a duração de um torpedo.

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